1. Introdução
O Século da Humilhação é um termo que se refere a um período histórico que se estende do início do século XIX até a metade do século XX, durante o qual a China enfrentou uma série de crises e humilhações provocadas pela dominação estrangeira e por conflitos internos.
O período é marcado por eventos significativos, como as Guerras do Ópio, a Revolta dos Boxers e a perda de territórios, que resultaram na imposição de tratados desiguais e na fragmentação da soberania chinesa.
A experiência de humilhação e resistência durante esse período gerou um forte sentimento nacionalista que ainda ressoa na China moderna. A luta pela soberania e pela dignidade nacional se tornou um elemento central na narrativa histórica da China, influenciando a política interna e as relações exteriores do país.
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2. As Guerras do Ópio
A Guerra do Ópio teve suas origens na crescente interação comercial entre a China e as potências ocidentais durante o século XIX. A Companhia das Índias Orientais Britânica, em busca de novos mercados, estabeleceu um comércio significativo com a China, focando principalmente na importação de chá, seda e porcelana. No entanto, os britânicos consumiam produtos chineses em volumes muito maiores do que os chineses adquiriam de bens britânicos.
Para equilibrar a balança comercial, os britânicos começaram a contrabandear ópio, uma substância altamente viciante, para a China a partir de suas colônias na Índia. O tráfico de ópio cresceu rapidamente, resultando em uma epidemia de vício que afetou a sociedade chinesa.
Diante dos efeitos devastadores do ópio, as autoridades chinesas tentaram restringir ou proibir sua importação, o que gerou tensões crescentes entre a China e a Grã-Bretanha.
Em uma tentativa de conter a disseminação do vício, o governo chinês confiscou e destruiu grandes quantidades de ópio. Os britânicos que consideraram isso uma violação de seus direitos comerciais e após as negociações diplomáticas entre os dois países falharam, a crescente hostilidade culminou no início da Primeira Guerra do Ópio em 1839.

2.1 A Primeira Guerra do Ópio (1839-1842)
As forças britânicas, equipadas com tecnologia militar superior, rapidamente derrotaram as tropas chinesas e o conflito resultou na assinatura do Tratado de Nanquim em 1842, que marcou o fim da primeira fase da guerra. Este tratado impôs condições severas à China, incluindo a cessão de Hong Kong aos britânicos, a abertura de cinco portos ao comércio britânico e o pagamento de indenizações financeiras substanciais.
O Tratado de Nanquim exacerbou as relações entre a China e o Ocidente e o comércio de ópio continuou a se expandir, com os britânicos mantendo sua influência sobre a China. Outras potências ocidentais, como a França e os Estados Unidos, também passaram vantagens comerciais, complicando ainda mais as relações sino-ocidentais.
2.2 A Segunda Guerra do Ópio (1856-1860)
As tensões culminaram na Segunda Guerra do Ópio, que se caracterizou como um conflito mais amplo que envolveu várias potências ocidentais.
As forças anglo-francesas novamente saíram vitoriosas, resultando na imposição do Tratado de Tientsin (1856) e do Tratado de Pequim (1860) à China. Esses tratados ampliaram ainda mais os privilégios comerciais ocidentais, abriram mais portos e legalizaram o comércio de ópio, resultando em uma humilhação nacional e contribuindo para o declínio da dinastia Qing e o surgimento de movimentos reformistas
3. A Revolta dos Boxers (1899-1901)
A Revolta dos Boxers foi uma tentativa de resistência à crescente influência estrangeira e à presença de missionários na China.
Inconformados com a ineficácia do governo imperial em impedir a crescente intervenção de potências estrangeiras na China, um grupo de patriotas formou uma sociedade secreta chamada “A Sociedade dos Punhos Harmoniosos e Justiceiros”.
Essa sociedade buscava mobilizar a população contra a opressão estrangeira. Os membros acreditavam que, por meio da união e da ação direta, poderiam reverter a situação de submissão e humilhação que o país enfrentava.
No entanto, a revolta foi rapidamente reprimida por uma coalizão de potências ocidentais, conhecida como a Aliança das Oito Nações, composta por soldados da Rússia, Grã-Bretanha, França, Alemanha, Itália, Áustria-Hungria, Japão e Estados Unidos que intervieram militarmente para proteger seus interesses na região.
A repressão à Revolta dos Boxers resultou em uma série de humilhações adicionais para a China. As potências estrangeiras impuseram concessões territoriais, que incluíam a ocupação de áreas estratégicas, e exigiram o pagamento de indenizações substanciais. Essas medidas agravaram ainda mais a já delicada situação econômica da China, contribuindo para um clima de descontentamento e instabilidade que perdurou por anos.
A Revolta dos Boxers, portanto, não apenas falhou em alcançar seus objetivos, mas também intensificou a dominação estrangeira e a exploração do país.
4. Principais Potências Envolvidas
Durante o Século da Humilhação, diversas potências ocidentais e o Japão desempenharam papéis cruciais na dominação da China. As principais potências envolvidas incluíram:
- Grã-Bretanha: foi uma das principais responsáveis pela introdução do ópio na China, levando às Guerras do Ópio. O país buscava expandir seu comércio e garantir acesso a mercados lucrativos, utilizando a força militar para impor tratados que favorecessem seus interesses.
- França: também participou das Guerras do Ópio e, posteriormente, se envolveu em conflitos que resultaram na imposição de tratados desiguais. A presença francesa na China se intensificou, especialmente no sul do país.
- Alemanha: embora uma potência mais recente no cenário colonial, buscou estabelecer sua influência na China, especialmente após a Conferência de Berlim (1884-1885), que dividiu a África e outras regiões entre as potências europeias. A Alemanha obteve concessões territoriais, como a cidade de Qingdao.
- Japão: emergiu como uma potência imperial após a Restauração Meiji em 1868 e também desempenhou um papel significativo na humilhação da China. A vitória japonesa na Guerra Sino-Japonesa (1894-1895) resultou na perda de Taiwan e na concessão de direitos extraterritoriais, além de aumentar a influência japonesa na Manchúria.
- União Soviética: No pós-guerra, foi a vez da União Soviética tentar ganhar influência nas fronteiras com a China, incluindo as regiões da Manchúria e de Xinjiang.
5. Reformas e Revoluções
Após o Século da Humilhação, a China passou por um período de intensas transformações que culminaram na Revolução de 1911. Este movimento foi impulsionado por um crescente descontentamento com a dinastia Qing, que era vista como incapaz de modernizar o país e resistir à dominação estrangeira.
As ideias de modernização e nacionalismo começaram a ganhar força entre intelectuais e revolucionários, que buscavam uma nova forma de governo que refletisse os interesses do povo chinês.
A Revolução de 1911 resultou na derrubada da dinastia Qing e na fundação da República da China, marcando o fim de mais de dois mil anos de governo imperial. Este evento foi um marco significativo na história chinesa, pois representou a transição de um sistema feudal para um governo republicano, embora a nova república enfrentasse desafios internos, como a fragmentação do poder e a luta entre diferentes facções políticas.
As reformas que surgiram nesse período incluíram tentativas de modernização da economia, da educação e das forças armadas.
O governo republicano buscou implementar políticas que promoviam a industrialização e a educação ocidental, refletindo a necessidade de se adaptar às novas realidades globais.
No entanto, a instabilidade política e a guerra civil que se seguiram dificultaram a implementação dessas reformas, levando a um período de caos e divisão.
Somente com a vitória na década de 1940 na guerra da resistência e com a fundação da República Popular da China foi considerado o fim do Século de Humilhação Nacional.
6. Lições para o Futuro
As lições aprendidas com o Século da Humilhação foram cruciais para a compreensão da importância da soberania e da resistência contra a dominação externa. A experiência de ser subjugada por potências estrangeiras ensinou à China que a unidade e a força interna são essenciais para proteger a nação. A soberania não é apenas um conceito político, mas uma questão de dignidade e identidade nacional.
A história da China destaca a necessidade de um governo forte e coeso que possa resistir a pressões externas e garantir a segurança do país.
As reformas e revoluções que se seguiram à humilhação externa foram fundamentais para a construção de uma nova China, que buscava modernização e respeito no cenário global.
Atualmente, a educação da Humilhação Nacional é um componente fundamental da educação patriótica promovida pelo Partido Comunista da China. Essa iniciativa visa fortalecer a identidade nacional dos cidadãos chineses. O foco dessa educação está nas guerras de agressão que o imperialismo impôs à China ao longo de sua história moderna, bem como nos tratados desiguais que foram assinados entre a China e as potências imperialistas.
Por meio dessa abordagem educacional, busca-se não apenas relembrar os episódios de humilhação enfrentados pelo país, mas também instigar um sentimento de orgulho e unidade entre os cidadãos.
A ideia é que, ao compreenderem as dificuldades do passado, os chineses possam valorizar a soberania e a integridade nacional, promovendo um forte senso de pertencimento e responsabilidade em relação à nação.
Essa educação é vista como uma forma de preparar os cidadãos para defender os interesses da China no cenário global, reforçando a importância de um patriotismo ativo e consciente.
REFERÊNCIAS
Cinco fatores do passado que influenciam atitude da China com o mundo. BBC News Brasil. Disponivel em: https://www.bbc.com/portuguese/internacional-59075741#:~:text=Grande%20parte%20do%20per%C3%ADodo%20entre,da%20Europa%20e%20do%20Jap%C3%A3o. Acesso em 16/04/2025
Guerra dos Boxers (1899 – 1901). Disponível em: <https://mundoeducacao.uol.com.br/historiageral/guerra-dos-boxers.htm>.
MURAL DE HISTORIA. A Guerra do Ópio: Conflito e Transformação na China do Século XIX. Disponível em: <https://www.muraldehistoria.com.br/2023/10/a-guerra-do-opio-conflito-e-transformacao-na-china-do-seculo-xix.html>.
ZHO, L. O SÉCULO DE HUMILHAÇÃO E A SUA INFLUÊNCIA NA CONSTRUÇÃO DA IDENTIDADE NACIONAL DA CHINA . E-Revista de Estudos Interculturais do CEI–ISCAP, v. 9, 9 maio 2021.